Um cidadão (bebaço),entra no ônibus , paga seu passe devidamente, mas na hora de passar na roleta acaba girando-a-a duas vezes, a segunda com o passe de um segundo cidadão que vinha logo atrás. O segundo cidadão, é claro, ficou puto, e sua reação, mais do que esperada, foi soltar o verbo.
É claro que o “beudin” não podia dar o braço a torcer, não tinha virado a roleta, imagina!
Aí, como os senhores podem imaginar, se passaram vários minutos de calorosa discussão, até que o sábio motorista, vendo que o infeliz rapaz sem passe não deixaria a história quieta e que o bêbado não assumiria a culpa, resolveu a situação liberando a roleta para o rapaz.
Onde eu entro nessa história? Bem, eu, uma mulher honesta e trabalhadora, estava, como todos os dias, depois de minha dura jornada, sossegadamente sentada no meu lugar lendo o meu livrinho de 700 paginas. Eu não levo uma vida muito agitada, não sou uma pessoa de posses, nem de grandes ambições, a única coisa que eu peço pro resto da humanidade, em troca por deixá-la em paz, é tranqüilidade, isso também implica não ser perturbada enquanto leio.
E sério, pouca coisa me incomoda dentro de um ônibus lotado, mas a peleja daqueles dois senhores não ia levar a nada, estava claro para mim desde o principio, nada, além me tirar do sério.
O Sr. Embriagado tirou uma nota de vinte da carteira e gritava a plenos pulmões que tinha pago a passagem, que tinha um bom emprego, dinheiro no banco,mulher e filhos (meu caro, enfie seu bom emprego, mulher e filhos na
Tonga da Mironga) e o rapaz em resposta gritava que não queria o dinheiro, apenas queria que o “truta ficasse esperto”
Imagine isso se repetindo por 2/3 de um percurso de quase uma hora...
...Eu esTAVA LENDOOOOOO...
Moby Dick é um livro extremamente antigo, sua linguagem rebuscada data da época em que as mulheres ainda utilizavam barbatanas de “Baleias Verdadeiras” em seus trajos, isso significa, meu querido leitor que já deve ter abandonado esse texto no primeiro parágrafo por não estar entendendo porra nenhuma, que você, ser humano normal, não o entenderia nem se estivesse lendo ele no mais absoluto silêncio, quem dirá com um bêbado bradando no seu ouvido. Esse exemplar, comprado num sebo por um real, é relativamente grande, o suficiente para causar um traumatismo craniano.
Eu não dei com o livro na cabeça dele...deveria ter feito.Perdendo gradativamente a paciência, eu comecei a sentir calor, a bufar, a falar entre dentes, e finalmente a ler em voz alta, no que muitas pessoas finalmente perceberam minha irritação.
Outras pessoas também se incomodavam a minha volta, podia notar pelos olhares em resposta a meus lampejos desesperados de fúria, uma senhora até ensaiou um belo discurso, que poderia ser resumido por “ calem a boca seus parvos”.
Devo ter fechado e aberto meu livro uma porção de vezes antes de o bêbado finalmente sentar do meu lado. Sim, ele fez isso!
Tendo finalmente a discussão nos meus calcanhares, finalmente me senti parte dela o suficiente para intervir. Olhei com um lindo sorriso sádico ás costa do bebum para as pessoas a minha volta, fechei o meu empoeirado exemplar do Moby Dick com toda a força de minhas delicadas mãos de filha de lavrador, ele soltou uma poeirinha cheia de ácaros, que nem eu sabia que habitava nele, e então finalmente eu falei sob os olhares de aprovação de todos:
- Escutem aqui Senhores, o caso já está resolvido, ele não quer seu dinheiro, e o motorista já pagou seu passe perdido, agora se vocês não se importarem, por gentileza parem de discutir, por que se ainda não notaram estão importunando o restante dos passageiros, que como os senhores também pagaram a passagem. (que poderia ser resumido por “ calem a boca seus parvos”.)
Acreditem ou não eu realmente fui bem educada, as outras pessoas, é claro responderam com “isso mesmo’s e é verdade’s”. Não olhei para os lados para ver se me olhavam como se eu estivesse louca, sei que o bêbado levantou do meu banco, pediu desculpas e não disse uma só palavra pelo resto da viagem...na verdade ninguém mais disse uma só palavra pelo resto da viagem...
Sei que eu pude voltar a ler meu livrinho, o que me deixou muito feliz.
Moral da história: sua maldita liberdade termina onde começa a minha, cale a boca enquanto eu leio, isso também vale pra emos e funk(qu)eiros sem fones de ouvido.
EpilogoDeus proteja os bêbados
GlossárioParvo:Zé Ruela
Tonga da Mironga: Perguntem pros caras do Fest Food Brazil, eles devem ter Twitter.
Moby Dick: Mais velho que sua vó, maior que Sr dos Anéis, mais chato que a novela “Os Mutantes”, quem escreveu foi um cara chamado Herman Melville, você não vai gostar, eu achei legal.
Baleia Verdadeira: Baleia da Groenlândia, Baleia Negra, Baleia Grande ou Baleia Legitima, tipo de baleia...mas por que eu to explicando isso? Você não vai sair pescar baleias mesmo.Ou vai? Se for, esse não é o mais nobre dos cetáceos, tente pescar cachalotes.
Trajos: mesmo que trajes ...sua anta
Bradando:...ah, vai se alto-copular , pegue um dicionário, coloca no Google...se vira.
E viveram felizes para sempre...
FIM
